Virgília Ferrão explora ficção especulativa em Lisboa

A escritora Virgília Ferrão é a autora seleccionada do programa de Residência Literária Maputo-Lisboa, organizado pelo Camões – Centro Cultural Português em Maputo e pela Câmara Municipal de Lisboa. Durante um mês, a autora vai explorar universos favoráveis à escrita da sua próxima novela
O Airbus da TAP aterrou no Aeroporto Humberto Delgado 10 horas depois de ter partido de Maputo. Como tem sido habitual nessas circunstâncias, mal o avião pousou na pista, as emoções dos passageiros “agitaram-se”, no entanto, com a devida contenção.
À chegada à capital portuguesa, a tarde estava bem agradável para quem vive em KaMpfumo. Por isso mesmo, os 29 graus Celsius não agrediram Virgília Ferrão. Pelo contrário, a escritora sentiu-se aliviada, pois, numa outra ocasião em Lisboa, calhou com o Inverno europeu, “sempre agressivo” para quem está habituado a altas temperaturas.
Na sala de desembarque, mal recebeu a bagagem, a autora de Sina de Aruanda e Os nossos feitiços seguiu viagem até a Rua da Boavista, no Cais do Sodré. Nas mais movimentadas artérias de Lisboa, Virgília Ferrão viu um pouco de tudo: os edifícios característicos, os cafés e, sobretudo, os turistas de vários cantos do mundo. Apesar de se encontrar tão longe dos seus, sentiu-se em casa, afinal, a fachada da zona antiga daquela cidade bem lembra a baixa de Maputo. E vice-versa.
Já no apartamento concedido pela Câmara Municipal de Lisboa, que, com o Camões – Centro Cultural Português em Maputo, organiza a Residência Literária Maputo-Lisboa, Virgília Ferrão dedicou-se a “apresentar-se” aos compartimentos do seu novo lar (por 30 dias), ora apreciando as particularidades do apartamento, ora identificando onde arrumaria cada objecto que trazia consigo.
Entregue a expectativa, a escritora convenceu-se de que no Cais do Sodré a sua primeira residência literária será e é uma óptima oportunidade para impulsionar a sua carreira criativa, quer em termos de exposição, quer em termos de pesquisa e intercâmbio. E ainda concluiu: “Aqui vou ter mais tempo para dedicar à escrita. Esta experiência vai alargar o meu conhecimento em várias áreas”.
No regresso à capital portuguesa, Virgília Ferrão leva consigo a pretensão de escrever uma novela, cuja história, entre variados espaços, vai desenrolar-se na Torre de Belém. Para o efeito, a escritora pretende captar uma perspectiva da cidade, considerando questões interculturais que mexem com a imigração e a identidade – Ainda há muita matéria para ficciconar, no entanto, garante a artista, a novela vai misturar humor, análise social e ficção científica/especulativa. “Tenho mais ou menos as linhas de orientação sobre a narrativa que envolve uma extraterrestre. Alguns colegas dessa extraterrestre vêem a este mundo, através de um portal aberto na Torre de Belém, e, a partir daí, terão de aprender a conviver com os lisboetas, infiltrando-se na Procuradoria-Geral da República Portuguesa”.
Além da novela, actualmente com título provisório, durante a residência literária, Virgília Ferrão espera produzir o terceiro volume da antologia Espíritos quânticos, que deverá incluir histórias de autores moçambicanos e portugueses. Sempre tendo como tema principal a ficção especulativa.
Virgília Ferrão é a segunda escritora moçambicana a fazer parte da Residência Literária Maputo–Lisboa, depois de Eliana N’Zualo. Nos anos anteriores, Amosse Mucavele, Eduardo Quive e Mélio Tinga também se beneficiaram do programa de intercâmbio literário, criado no abrigo do protocolo de cooperação celebrado entre a Câmara Municipal de Lisboa (CML) e o Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, através do Centro Cultural Português em Maputo, de incentivo e estímulo à criação literária portuguesa e moçambicana e aposta na internacionalização da cultura.
SOBRE A ESCRITORA
Virgília Leonilde Tembo Ferrão é escritora e advogada. Estreou-se em 2005 com o lançamento da obra literária intitulada O Romeu é xingondo e a Julieta machangane, sob a chancela da Imprensa Universitária da UEM. A sua segunda obra, intitulada O inspector de Xindzimila, foi publicada em 2016, sob a chancela da editora brasileira Selo Jovem. Foi galardoada com o Prémio Literário 10 de Novembro, 2019, atribuído pelo Conselho Municipal de Maputo, tendo sido a primeira mulher a vencer este prémio. Em Junho de 2022 publicou o romance “Os nossos feitiços”, pela Katuka Edições, o qual foi agraciado com o 2º lugar pelo Prémio Bunkyo de Literatura 2023, no Brasil. Editou a antologia Espíritos quânticos, volumes 1 e 2, em 2022 e 2024, respectivamente. Tem contos traduzidos para o inglês, o espanhol, o eslovaco e o alemão, publicados em diversas antologias e revistas.