A sombra do canhoeiro

“Fomos educados para o crescimento, mas não para a felicidade…”, Pepe Mujica Fez-me comoção estas palavras! Procurei na minha ingenuidade sulista, quer dizer terceiro mundista, o alcance. Os tempos são de incerteza. As manhãs continuam cinzentas, o eco dos pássaros desapareceu sob a floresta de concreto que nasce às catadupas nesta cidade atolada de miséria!
Navego como quem se espreguiça no soalho da infâmia pelas parangonas dos noticiários do outro hemisfério. Debalde! Simplesmente quase nada, algumas notas de pesar, quase nulas num rodapé raquítico.
As memórias do século XX vão desabando ao ritmo dos dispositivos electrónicos que trocam a interacção pessoal pelo distanciamento. Vivemos tempos sombrios! A solidão é uma constante! Um sonho ardido na alvorada do pensamento engajado. Pois é!
Cambaleamos com vídeos e fotos em lugares paradisíacos para esconder de soslaio o temor da solidão, ou a angústia nos olhos duma geração ensinada ao despesismo exacerbado!
Tudo é fugidio! Ninguém quer entender o outro! O sabor da espera foi trocado pelo refresco da pressa embrulhado entre os dedos da mão!
Será esta a sociedade do cansaço?
Que melodias assombram seus olhos?
Regresso a minha vigília pelos noticiários! O Presidente mais pobre do mundo morreu!
A miúde os seus pensamentos são colados por admiradores, gente comum, que ao virar da esquina aprendeu a soldo o sabor da miséria.
“A vida não é só trabalhar. Tem que se deixar um bom capítulo para as loucuras que cada um tem…”
Rio-me, com os olhos manchados de lágrimas, porque a poesia tem esses momentos inusitados de estar só com a escrivaninha e rir de nada e por nada.
Que loucuras faltam aos homens do meu tempo?
Não há luz nas trevas! Abaixo do equador o cheiro da miséria faz escola! O silêncio dos bons não humedece a boca amarga!
A cada instante, o capital, este nazareno do nosso tempo descerra os caminhos do vazio e constrói castelos sobre os mangais da esperança!
Deixo-me sentar nesta frondosa sombra de canhoeiro; beijam-me os raios raquíticos neste inverno ainda em flor. Eis a economia de mercado açambarcando os últimos resquícios de ideais por herdar.