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Realização de eventos infantis: Produtores e músicos defendem que é preciso ter em conta a diversidade cultural 

Produtores de eventos e músicos consideram que é preciso educar a sociedade sobre os conteúdos infantis no país, pois o problema não se limita apenas aos espectáculos. Consideram ainda que as leis devem ter em conta a diversidade cultural nacional e não apenas baseadas no que acontece nas cidades. 

A Procuradoria-Geral da República, na Cidade de Maputo, reacendeu o debate sobre a produção e realização dos eventos infantis no país. Numa nota dirigida ao Instituto Nacional das Indústrias Culturais e Criativas, INIC, a Procuradoria alerta para o perigo que os conteúdos inadequados podem representar para as crianças.

No mesmo documento adverte, por exemplo, que as músicas devem evitar expressões vulgares, ofensivas ou inapropriadas para os menores de idade e que as temáticas devem ter em conta os conteúdos positivos, como amizade, diversão, aventuras e aprendizado.  

Acima de tudo, devem ser conteúdos que promovem a inclusão, diversidade e respeito pela dignidade da pessoa humana. 

Produtora de eventos infantis, há 14 anos, Lizha James não vê nenhum problema nas medidas anunciadas pela Procuradoria-Geral da República, até porque elas não constituem novidade.

“Nós temos a INIC a quem nós respondemos. É a nossa instituição, que nós como promotores e como fazedores da cultura respondemos. Tudo já foi acautelado tivemos as autorizações, várias reuniões, entretanto, esta situação nós recebemos pela internet. Nós sabemos muito bem, que a nossa procuradoria   é uma instituição muito séria e não estaria a intimar os promotores através da internet. Iria direcionar a intimação a cada um de nós”, disse a artista e produtora de eventos infantis. 

Lizha James alerta que é preciso haver mudanças na produção de conteúdos infantis para salvaguardar os direitos das crianças.

“Sobre a música é uma sinergia que nós temos que fazer com o Ministério da Cultura, com os promotores, os investidores, os empresários, para que possamos criar, no âmbito social, porque as crianças não podem trabalhar (…) Entretanto, é uma sinergia que tem que haver para que possamos criar músicos que se vão divertir no palco e não para receber cachês  (…) e é uma sinergia que tem que ser criada no âmbito social para que possamos criar novos músicos infantis”, afirmou Lizha James. 

  José Mucavel, por sua vez, é veemente ao afirmar que não existem eventos infantis no país. “Os eventos todos que estão a ser feitos são empurrados para a infância, mas não são. Se existem, são aqueles do colono, porque continuamos ainda colonizados nessas área”. 

Todos os patinhos sabem bem nadar, cabeça para baixo e rabinho para o ar”, cantou o músico, recordando algumas canções infantis deixadas pelos colonos, acrescentando que é um direito da criança continuar a cantar essas canções de há cinquenta anos, assim como aprender a falar a sua língua.  

Voz autorizada, o autor do “Baladas para as minhas filhas” entende que o problema dos conteúdos infantis no país só poderá ser resolvido com a criação de leis abrangentes.

“Eu até não desgosto da lei,  porque a criança não tem que andar aí a aprender coreografias adultas antes do tempo (…) Em termos de coreografia mesmo, se andarem por aí a ver, como é que ela aprende a dançar, porque, se calhar, alguém viu e não gostou, porque a criança fazia gestos obscenos, e toma com a lei. Eu estou a pedir à Procuradoria da República a descer por todas as etnias deste país   e ver como é que a classe africana educa uma criança”, recomendou Mucavele.  

Para o produtor e crítico musical, DJ Beatkeeper, o problema dos conteúdos infantis vai além do que as crianças consomem nos espectáculos, mas sim é estrutural.

“É um assunto que preocupa toda a sociedade realmente, não só na área do entretenimento que é o espetáculo, mas algumas televisões não têm pautado por este rigor em relação aos horários que passam certas programações. Notamos também nos conteúdos musicais e também nos livros escolares (…) Então, o problema de conteúdo para as crianças é transversal, não diz respeito só aos palcos”, explicou o produtor

Sobre o documento da PGR, Beatkeeper anota que o mesmo tem muitas lacunas e não é esclarecedor.

“Entendo que não é trabalho da Procuradoria legislar. Então, se ela cita um conjunto de regras para avaliar se conteúdo é para as crianças ou não e, no mesmo trecho, não indica qual é a lei que se usou, os promotores de eventos não têm recursos sobre aonde ir  consultar para procurar mais subsídio para saber se está em conformidade com a lei ou não. Não é a partir de uma intimação que a Procuradoria vai indicar quais são os procedimentos de organização de espetáculos, mas deve citar a lei  caso exista, do contrário não é numa intimação da Procuradoria que deve aparecer isso”, explicou.  

Para o  produtor musical, a Procuradoria-geral da República deve abrir-se a novas opiniões.

“Não havendo clareza, de ponto de vista da lei, como identificar se o conteúdo é infantil ou não, e não havendo mecanismo estabelecidos anteriormente de como os produtores de eventos podem obter um selo que diz para que faixa-etária é a sua produção artística, acho que é prematuro correr para sancionar as pessoas”, acrescentou Beatkeeper. 

Já o DJ Dilson, também produtor de eventos, diz que a comunicação da PGR peca por ser tardia e, sob seu ponto de vista, criou vários embaraços. “Mas podia ter sido lançada muito antes, como forma de proteger, não só a criança, como também os promotores, pois há quem já fez investimentos e já pagou os 50 ou 100% das estruturas, e tudo agora vai por água abaixo, por não se querer fazer frente a procuradoria”, disse 

Ainda assim entende que as medidas da PGR são oportunas e poderão proteger as crianças de conteúdos inadequados. “É uma iniciativa boa porque visa proteger as crianças  e dar oportunidade às crianças e aos projectos infantis e exaltar aquilo que é festa para criança”. 

Em exclusivo ao “O País”, a ministra da Educação e Cultura, também reagiu ao documento da PGR e considera que veio num momento oportuno.

“É um trabalho conjunto entre nós da cultura e a Procuradoria da República. É uma equipa conjunta e produziu-se aquele documento. O que nós vamos fazer agora é resumir os pontos-chave, para aqueles que efectivamente temos que observar em relação às nossas crianças, para trabalhar com todos os promotores da arte e cultura, para observarem [as normas previstas]. Estamos muito felizes, porque há actividades que envolviam as nossas crianças e nós até ficávamos envergonhados, mas agora que está legislado todos vão saber que temos que respeitar a idade das nossas crianças   e deixarmos que elas cresçam”, disse a Ministra.  

Os intervenientes entendem que a sociedade deve melhor educar-se, de modo a transmitir bons valores às crianças.

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